Tem os preferidos, os preteridos, os temidos, até!
Desses zolhões vidrados do Alípio até eu tenho medo!
Mas tem coisas, Pedro, que só eles podem testemunhar sobre a sua vida, com riqueza de detalhes. Há pouco menos de dois anos, eles só recebiam umas palmadinhas de leve e ficavam molhados de saliva. Já faz um ano e meio, uns apertões mais fortes. Tem cerca de um ano, começaram a levar uns baita trancos e, logo em seguida, também pisões, e foram coadjuvantes de algumas de suas adoráveis quedas.
Mais recentemente, eles passaram a ganhar outros tipos de tratamento da sua parte: bracinhos articulados já sobem e descem nas suas mãozinhas hábeis, como se acenassem; as pecinhas de encaixar já ganham ares de edifícios, que, segundos depois, são vítimas dos terríveis desabamentos que você, como um Godzilla-neném, proporciona; carrinhos já se envolvem em corridas, derrapagens, capotamentos e inevitáveis colisões; bichos de pelúcia já participam das suas conversas, ou ao menos ouvem, atentos, os confusos e suaves monólogos que a sua gostosa vozinha profere – enquanto são esmagados ou atirados no chão, é claro.
Quando vejo o Buzz Lightyear cortando os céus da sua imaginação, "caindo com estilo" de tudo quanto é lugar, transformando-se em herói quando salva o Woody de se esborrachar no chão durante a vigésima exibição de Toy Story do dia, ou quando você se transforma nele, voando dos meus braços para o alto e de volta para os meus braços, filho... minha mente vai ao Infinito e Além. Mas meu coração, esse fica bem aqui, tentando entrar em cada uma dessas suas fantasias, vistas a partir desses homens e animais de plástico, e te olhar como um gigante a sonhar os feitos gigantescos que você ainda vai protagonizar.
Quando você faz aquela cara de desafio e diz, como o Buzz, ao pousar na cama do Andy, "voo!" - eu acredito!
Se os seus brinquedos falassem, Pedrinho, eu bateria papo com eles toda noite, até tarde, depois que seu sono já foi abençoado com carinho pela oração materna. E eles me contariam a história fabulosa de uma criança que, novinha de tudo, ficou por demais esperta em um estalar de dedos; o conto fantástico do bebezinho que, de só observar o mundo com olhinhos atentos, passou a coordenar as mais intrépidas aventuras; a saga maravilhosa de um neném engatinhante que foi virando menino voador a olhos vistos, sem precisar de casulo.
Eu daria tudo para me sentar com eles e tomar um chá, como se fosse com a Senhora Marocas, e ganhar mais alguns minutos, horas, dias, talvez, de exibição e análise desse filme-verdade que é o meu filhinho crescendo. Com eles, eu teria mais ângulos, perspectivas, novas versões do roteiro mais bonito, caótico, improvisado e mágico do cinema da vida, que é o desenvolvimento de um ser assim, humano.
Mas eu sei que não dá. Quando eu adentro seu quarto, eles desfalecem de volta à posição de brinquedos inertes que preferem mostrar às pessoas... É melhor para eles. Como os brinquedos do Andy, eles sabem da importância que têm por serem os seus brinquedos e te ajudarem a descobrir um mundo que, enquanto se torna mais real e cruel com o passar dos anos, pode ter, sim, muita alegria e faz de conta.
Su quarto, mi quarto? No señor! Soldados, avante!
E é melhor que eu só possa, mesmo, ver você com meus próprios olhos: assim eu não invado os bastidores misteriosos onde são criados os caminhos que você vai trilhar. Eu confio nisso e n'Ele que há lá: no Infinito e Além que trouxe esse rapazinho extraordinário para mim.
P.S.: Todas as fotos são do Instagram da minha magnífica companheira e mamãe do Pedrinho, Thaís.